Saturday, February 10, 2007

The Gift :: Vinyl.. Aula Magna

Revisão do concerto na Aula Magna

Os The Gift apresentaram-se na Aula Magna, em Lisboa, num concerto que representou o culminar de uma digressão por todo o país e a sua "prova de fogo". Passemos aos factos.
São quase 23h00, quando começam a soar as primeiras notas do instrumental "La Folie", com o palco ainda vazio. O público que quase enchia a Aula Magna, e que começava já a denotar alguma impaciência, começa de imediato a acompanhar o ritmo com palmas. A banda vai entrando em palco, tomando os seus lugares, bem como os músicos convidados, nas secções de cordas e metais. Os aplausos redobram. Quando Sónia Tavares, a vocalista, entra em palco, é o delírio.
Está criado o ambiente para uma noite que se irá desenrolando em crescendo, até culminar com a total rendição do público e o êxtase da banda.
O primeiro tema é "Dream with someone else's dream", que foi, sem dúvida, o pior da noite. Feedback, voz irregular, graves desajustados... no entanto, as correcções necessárias vão tendo lugar e a prestação ganha consistência.
Segue-se "Real (Get me for...)", "Changes" e "Love Boat", este último lindíssimo, com o problema dos graves finalmente resolvido, mediante a insistência do guitarrista. Julgo ter sido este o ponto a partir do qual tudo soou perfeito, com os The Gift no seu melhor.
No seguimento, "Ok! Do you want something simple", tema que, segundo Sónia - "talvez vocês já tenham ouvido por aí...". É notável a sua auto-confiança, a desenvoltura que demonstra em palco, tanto na forma de se movimentar, como de se dirigir ao público. E Sónia tem perfeita consciência disso. Em "OK!..." o público entrega-se totalmente, cantando em uníssono, com deleite e emoção inegáveis. É, aliás, esta capacidade de criar temas quase épicos, intensos, emocionais que mais me agrada nos The Gift, numa altura em que a música parece evoluir num sentido cada vez mais "inorgânico".
"Ouvir" é o primeiro tema da noite com um arranjo diferente do apresentado no álbum Vinyl, tornando-se bastante mais dançável e merecendo improvisação por parte de Sónia. A secção de cordas tem a sua oportunidade de "brilhar" na parte final do tema, com uma prestação absolutamente irrepreensível e muito aplaudida. Segue-se "First Chapter".
Nuno Gonçalves toma a vez de Sónia, em "Concret", tema que diz respeito à incerteza do grupo quanto ao acolhimento do seu trabalho. Apesar da fragilidade da voz de Nuno, a capacidade de conquistar o público, talvez pela sua evidente "sinceridade", esteve inteiramente presente.
"Truth" tem uma recepção entusiasta por parte da Aula Magna, com direito a coro, que se prolonga para o excelente "Nowadays", após o qual os The Gift se despedem uma primeira vez de um público perfeitamente arrebatado. Nesta altura, quase toda a sala aplaude de pé e o regresso não se faz esperar.
"My lovely mirror" tem direito a uma introdução instrumental prolongada, executada por Nuno, ainda sozinho em palco. Segue-se o único novo tema apresentado pelo grupo, "Five minutes of everything", suportado por imagens vídeo e resultando bastante eficaz, embora não tão intenso como outros. A sua estrutura parece mais próxima do formato pop-song convencional do que qualquer outra. Dá-se nova despedida e série de agradecimentos.
A banda volta aos seus lugares e interpreta "Weekend", criando o que foi, na minha opinião, o momento (mais) alto da noite. A música soa bastante mais intensa e rápida do que na sua versão "vinylica", originando a entrega total de Sónia, que se movimenta freneticamente sob efeitos de luzes muito bem conseguidos (o que não foi uma constante ao longo do concerto), até ao final do tema, com a bateria rapidíssima, como que a sair de controlo, mas no bom sentido. Fantástico é a palavra para descrever o momento.
Para "The end", apenas ficam Nuno e Sónia em palco, com esta a pedir silêncio - "vamos criar aqui um momento muito íntimo". É chegada a altura prevista pela banda para o encerramento. No entanto, a terceira despedida da noite não seria ainda a última... O público exige mais, e não se vê ninguém a abandonar a sala.
O final, com "Ok! Do you want something simple", o único momento não planeado em todo o concerto, pode ser descrito como um momento de comunhão colectiva total. Toda a sala se levanta, dançando e cantando, com uma entrega raramente observada, que culmina com a invasão do palco por parte de largas dezenas de pessoas. A felicidade dos elementos da banda era inegável, bem como a empatia e proximidade gerada em relação ao público.
A impressão indelével que me fica de todo o concerto pode ser resumida numa palavra. Entrega. É para isso que servem os presentes.

Sónia Godinho
in www.paredesdecoura.com - 9 de Junho de 1999